11h30
Entrei no autocarro para São João. Tinha de sair de casa para estudar, já que em casa parece totalmente impossível. Às tantas, quando chego à Alapraia, entra uma senhora que se senta ao meu lado e começa a meter conversa comigo. Pensei que fosse apenas mais uma conversa de fazer passar o tempo, nunca me passaria pela cabeça que àquela hora recebesse uma lição de humanidade.
Senhora: Estes motoristas, quase que matam as pessoas à velocidade que arrancam... Uma pessoa vai sentar-se e o homem é bruto a arrancar... Há os serial killers, e há os bus killers.
Ri-me, achei engraçado como uma senhora assim mais de idade se lembrava de dizer aquilo. Eu ia distraída, a pensar na minha vida, nas minhas relações, a olhar pela janela com o telemóvel na mão, quando a senhora me interrompe os pensamentos outra vez.
Senhora: Você é daquelas pessoas que olha sem ver, ou das que vê quando olha?
Margarida: Como assim?
(aí já sabia que a conversa ia ser interessante)
S: Já reparou que, neste autocarro, está um homem sem mão?
M: A sério? ( e comecei a olhar ) Não tinha reparado...
S: Muitas vezes, as coisas passam-nos despercebidas. As pessoas olham para tudo, mas, na verdade, não vêem nada.
M: Isso é bem verdade.
S: Temos tendência para deixar escapar os pormenores, como se não interessassem. A verdade é que às vezes são os que dizem mais. Devíamos todos ser mais atentos. Vocês jovens que se dão muito aos computadores e a essas coisas de informática.. Deviam fazer, como é que se diz?, um scanning. Chegam a um sítio, olham para tudo e vêem uma vez e depois voltam para trás e vêem só o mais interessante.
Depois a conversa foi um bocado mais passa-tempo, no entanto sempre agradável, até que a senhora ficou calada durante um tempo e quase que deu um saltinho, como quem acaba de ter uma ideia, e diz-me:
Propunha uma modificação na gramática.
M: Qual?
S: Uma alteração nas pessoas dos verbos. A primeira pessoa devia ser Ele, a segunda pessoa Tu e só depois, na terceira pessoa, é que devia ser Eu. Deviam ser os outros antes de nós... Mas não, é sempre eu, eu, eu em primeiro. Por isso é que a gente não se entende.
Dito isto, cheguei à minha paragem.
S: Espero que tenha gostado desta lição de humanidade
M: Gostei muito, mesmo. Obrigada e tenha um bom dia.
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