Podia ser um dia qualquer
Podia não ser nunca
Podia ser a espera
O que mais inquietava
Podia ser a dúvida
A certeza que não queria ter
Podia ser tudo
E parecia já não ser nada
Mas era preciso que fosse
Algo
Já tanto fazia
Tanto se dava
Podia ser um paraíso
E não o inferno presente
Podia ser bom
Fora bom
Mas era mau
Não podia ser mau
Não, isso não podia
Já não podia mais
Podia ser calma e tranquilidade
Bem-estar e generosidade
Era turbulência, inquietação
Perplexidade, torpor
Por não poder ser
Não podia ser mais assim
Daria o meu tempo todo,
Anos, minutos e até segundos
Para que nada fosse assim
Porque podia, devia, ser melhor
Podia ser bom para todos
Não pode ser apenas para um
Podiam evitar-se as lágrimas,
A incompreensão
A barafunda de não sabermos
O que somos
Se não nos derem importância
Poderemos ser importantes?
Não se pode andar à deriva
Sem o risco de perder o rumo e o Norte
Merecemos mais
Somos importantes
Se o não somos
Deixamos de existir
E acaba aqui
Cada dia tem de ser válido
Ele não voltará atrás
Para emendarmos o que se fez
Voltarão, sim, novos dias
Que nos servirão de emenda
Se tivermos aprendido
Não quero saber tudo
Perdia o interesse
Quero estar capaz de aprender
E saber que o posso fazer
Para ensinar
E ter o prazer de crescer mais
Crescendo ao lado de quem cresce
Ensinar o prazer do Sol, duma Lua cheia
Duma brisa de Verão
Que afaga os rostos
De quem vai ao seu encontro
Ou se senta à sua espera
Podia haver felicidade
Mas do nada pouco nasce
A não ser mais nada
E daqui tem de nascer algo
O Mundo não pára
Por teres desistido
Nós não desistimos
Não queremos desistir
Nem sequer de ti
Ainda…
A nossa resistência é o nosso mérito
A medalha ganha no fim dos dias
É o que nos leva a atravessar oceanos
E a baptizar novas terras
Somos como o tempo
Um relógio nunca pára
Quer sinta a tua pulsação
Quer seja posto de lado
Não aprende nos livros
Quem não aprendeu com o tempo
Não saberia sequer entender as palavras
Podia ser tudo melhor
Assim houvesse vontade
Preocupa-me agora
Até me habituar a não me preocupar
E fá-lo-ei, como fiz muitas outras coisas
As que quis e as que não quis
Vou viver como não quero
Mas vou viver pelo que quero
Foi a última lição
E apetecem-me todas as outras
Mas quero comigo
Quem queira aprender
Quem queira…
Comigo envelhecer
Maria Fernanda Porto (mãe)
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